sexta-feira, 18 de março de 2011

Café re-Quentin Tarantino

Todos aqui sabem do meu gosto pelos filmes de Quentin Tarantino. Acontece que há uma controvérisa que eu e meu irmão temos a respeito da maneira como o cineasta trata algumas das questões pertinentes a todos os seres humanos. Chega de conversa! Vamos ao que interessa, claro, tarantinescamente falando.

Capítulo I - Eterno déjà vu

Os filmes de Tarantino tratam sempre da mesma questão: a perversidade humana. Todas as nuances que se desenvolvem a partir disso são dela variantes e sempre nela culminam, travestindo-se ora como raiva, ora medo, ora angústia, ora ódio, ora vingança, ora pura e simplesmente perversidade (como a personagem de Michael Madsen em Cães de Aluguel). Mesmo as personagens heróicas são perversas, impulsionadas não pelo altruísmo "melado" do herói romântico, mas pela busca de fama do herói grego, aquele que já conhece o seu destino antes de encontrá-lo, mas que, ainda assim, vai em busca dele pelo simples prazer que o caminho a ser percorrido lhe oferece. O exemplo é a personagem Beatrix Kiddo, interpretada por Uma Thurman em Kill Bill vols. I e II, que, aparentemente, busca vingança pelas atrocidades que sofreu na mão de Bill e suas Víboras Mortais e pela morte de sua filha. No final do vol. II, Bill, o mais filho da puta e o mais sábio de todos os personagens criados por Tarantino, faz uma análise de Kiddo e expõe brilhantemente a saga do herói grego encarnada na própria Beatrix Kiddo: uma heroína com foi vilipendiada de todas as maneira e que tinha uma justa razão para a vingança... mas que se compraz em fazê-lo, portanto, perversa. A mesma analogia se aplica a Butch, interpretado por Bruce Willis em Pulp Fiction e ao Tenente Aldo Raine em Bastardos Inglórios.

Capítulo II - A Narrativa Mortal ou a assim chamada "conexão desconexa conectada de forma atemporal"

Desde que era um roteirista falido, desempregado e que não pegava ninguém, a marca registrada de Tarantino sempre foi bipartite: por um lado, a força, o peso e a profundidade dos diálogos; por outro, uma narrativa extremamente onisciente e desconexa, que, de uma maneira brilhante, se despe da sua onipotência ao longo do desenvolvimento da trama e demonstra sua onipresença no desfecho. Enquanto a trama não é concluída, a morte paira no ar e assombra o espectador que é acometido com espasmos de catarze periódicos. A fragmentação do enredo e das tomadas de cena são todas partes intimamente ligadas entre si - sem, contudo, que se forme necessariamente um todo. Cada filme de Tarantino, portanto e a meu ver, é como um livro de contos: pode até ser que haja alguma sincronia, mas cada conto (ou cada capítulo de um filme) tem plena coerência se analisado em si mesmo ou em um contexto apartado da trama.

Capítulo III - Rumpelstiltskin ou "quem decifrou o nome de Tenbreenan Cragsistan"

Tudo na vida tem seu preço da mesma forma que todo ser humano tem o seu. Mas quem estaria disposto ou teria condições para arcar com tamanhas despesas? É por isso que Tarantino faz um trato com seu espectador... um trato que é assinado com sangue, sim! Tarantino nos serve o sangue das suas personagens e nós servimos o sangue da nossa catarze. Como não podemos servir nosso próprio sangue, o trato é o seguinte: "minhas personagens sangram por você... porém, quando minha personagem sofre, você também terá que sofrer; quando minha personagem sangra, também você deverá sangrar, e assim ipsis litteris ad infinitum. Contudo, se você descobrir os meus personagens onde o nome delas não está e o meu nome em personagens onde eu não estou, eu pagarei o seu preço". Acontece que ninguém, até hoje, conseguiu responder a este enigma. Portanto, cada obra de Tarantino é única.

Capítulo IV - Café Re-Quentin Tarantino

Existe uma música do Guns n' Roses, a segunda faixa do álbum "Use Your Illusion I" (Geffen Records, 1991), chamada "Dust n' Bones, que ilustra aquilo que o ser humano realmente é: poeira e ossos. A relação que vejo entre esta música e as obras de Quentin Tarantino é pura e simplesmente o fato de que, embora sejamos perversos ao amar alguém ou nos utilizemos do amor para justificar a nossa perversidade, no final, temos as mesmas reações para as mesmas situações. Não importa que alguém seja um gangster do calibre de Marcellus Wallace ou do grande Bill; nem quão apurada sua habilidade como Pai Mei, nem mesmo quanto poder você tenha sendo um Ditador... haverá sempre alguém na expreita; alguém que não se intimida com essas coisas; alguém como Stutman Mike que está pouco se fudendo se você é um ser humano cheio de sonhos. Essas personagens sempre demonstram a mim, assim como o Joker, o quão ridículas são as nossas tentativas em controlar tudo, inclusive nossas próprias vidas. Sejamos perversos ou não, queiramos vingança com ou sem motivo, ou simplesmente apenas gostemos de sadismos, não importa. A balança sempre se equilibra, não necessariamente, no fim.

Por isso, digo, sem o menos pesar, que Quentin Tarantino é café requentado: já conhecemos o gosto, mas somos compelidos a beber por forças alheias a nossa compreensão.

Poderíamos até evoluí-lo de 'café requentado' para 'café requintado'... mas, ainda assim, café requentado.

Um comentário:

  1. Olá!

    FAN-TÁS-TI-CO este post!
    Adorei!
    Inpirou para escrever o mais novo post do meu blog.

    Convido a você, Van, e a todos os interessados a darem uma olhadinha em

    http://ocaminhorecusado.blogspot.com/2011/04/controversia-van-cido-sobre-obra.html

    Esta é minha "resposta" a este post.

    Abraços!

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